Estudo no Refúgio Biológico Bela Vista desvenda olhos das harpias

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Um estudo sem precedentes está desvendando o funcionamento dos olhos das harpias (Harpia harpyja), a maior ave de rapina das Américas. A pesquisa definirá o que é um olho normal para a espécie, parâmetros até agora ignorados pelos cientistas. No futuro, o conhecimento será fundamental para que as harpias sejam reintroduzidas na natureza com mais segurança. Hoje, os animais estão em risco de extinção na América do Sul.

A pesquisa, feita em animais do Refúgio Biológico Bela Vista (RBV), margem brasileira da Itaipu Binacional, é conduzida pelo médico veterinário Wanderlei de Moraes como parte do seu doutorado em Oftalmologia Veterinária, pela Universidade Federal do Paraná (UFPR),  com orientação do Prof. Dr. Fabiano Montiani-Ferreira. A previsão é o projeto esteja concluído nos próximos 20 meses.

“Isso nos dará uma referência do que é um olho normal de harpia, permitirá identificar os problemas oculares e qual a referência básica que teremos para soltá-la na natureza”, explicou Moraes. “A partir deste padrão, o veterinário poderá decidir melhor se o animal pode ser solto, por estar em ótimas condições de saúde, se ele vai ter que passar por algum tratamento ou, ainda, se não tem condições de soltura”, completou.

Moraes também coordena o Programa de Reprodução de Harpias em Itaipu, o mais bem-sucedido do mundo na atualidade. A perspectiva é que, numa próxima etapa, o programa de Itaipu abarque um plano-piloto de reintrodução de harpias em ambiente natural.  

Mas o alcance não será apenas local. A iniciativa pode ser útil para ações como o Programa de Conservação do Gavião-real (outro nome dado às harpias), o PCGR, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. No Brasil, o PCGR é referência no monitoramento de ninhos da espécie nas florestas da Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal e Cerrado. Na última década, o programa acompanhou vários indivíduos devolvidos à natureza, todos eles de origem silvestre.

Coleta começou em maio

O trabalho de campo do estudo envolveu uma bateria de exames, feita nos dias 20 e 23 de maio, na qual foram examinadas 21 das 23 harpias do plantel do RBV. Os resultados servirão de subsídio para o projeto e também darão um panorama sobre a saúde das aves do refúgio, que passaram por exames de sangue (hemograma completo).

Na parte oftalmológica, foram conferidas produção de lágrimas, medidas biométricas (tamanho dos olhos) e pressão intraocular (fator que auxilia os olhos a continuarem redondos), além de analisados os tipos e quantidade de bactérias que compõem a microbiota do olho.

A atividade contou com o auxílio de dois pesquisadores – os médicos veterinários Thiago Alegre Coelho Ferreira, mestre em Ciências Veterinárias pela UFPR, e André Tavares Somma, doutorando em Oftalmologia Veterinária pela UFPR.

Segundo os pesquisadores, uma das vantagens é quantidade de exemplares da espécie no local. Quanto mais amostras, maior a garantia – e a cientificidade – do padrão do olho normal. “É uma ocasião de pesquisa extremamente rara. A disponibilidade destes animais para outros pesquisadores é difícil e aqui, na Itaipu, temos um dos maiores plantéis do planeta”, disse Ferreira.

Visão de longo alcance garante sobrevivência

As aves de rapina são os animais que enxergam melhor no mundo. A acuidade visual garante a caça, a própria sobrevivência e a de seus filhotes. Algumas rapinantes chegam a identificar a presa a 5 mil metros de altura, como no caso da águia-de-asa-redonda (Buteobuteo), que consegue focalizar um pequeno roedor enquanto voa nesta altitude.

Para as harpias a visão não é menos importante. Na natureza, elas constroem seus ninhos a 30 a 40 metros acima do nível do solo, acima da copa das árvores. No RBV, os recintos reproduzem o ambiente – um pouco mais baixo, mas em cativeiro o alimento é garantido.

“A harpia, em particular, habita áreas densas de florestas, é um animal grande. Para se locomover neste ambiente e desempenhar atividade de caça, ele depende fundamentalmente da visão”, afirmou Somma.

“Uma ave de rapina que não enxerga morre de fome. E conhecer melhor a visão destes animais pode nos ajudar a entender porque eles têm certos comportamentos”, completou Ferreira.

Se, por um lado, o longo alcance da visão das aves de rapina é de conhecimento público, cada animal tem uma especificidade. Pouco se sabe, por exemplo, das estruturas internas de olhos das harpias, como o “pecten”, uma estrutura presente no fundo dos olhos das aves, cuja função ainda não tem consenso entre os cientistas.

Na Itaipu, pela primeira vez os pesquisadores puderam avaliar o fluxo sanguíneo do pecten das harpias, por meio de uma minuciosa ultrassonografia oftalmológica. As descobertas poderão ajudar no detalhamento do funcionamento dos olhos.

“Os seres humanos têm, na frente da retina, um gel que mantém o olho redondo. No caso das aves, não se trata de um gel, mas um líquido”, explicou Ferreira. “A contradição é saber se o pecten serve para renovar o líquido ou para manter a retina”.

Para Moraes, o avanço neste conhecimento é importante porque pode servir para melhor a compreensão também da visão de outras aves. “Uma pesquisa vai ajudando e completando a outra”, concluiu. Na prática, quem ganha são os animais.

Impacto externo

A coordenação do Programa de Conservação do Gavião-real (PCGR) considera que os resultados das pesquisas desenvolvidas na Itaipu serão importantes para avaliar a saúde visual como um todo, pois ela é um dos vários critérios utilizados nos casos de reabilitação de harpias resgatadas com potencial soltura na natureza.

Para a coordenadora do PCGR, Tânia Sanaiotti, tanto esta pesquisa como o Programa de Reprodução de Harpias contribuem também para dois objetivos propostos no Plano de Ação Nacional (PAN) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Um deles é de “Conservação de Aves de Rapina”, de 2008. O outro é o recém-criado “Plano de Ação Nacional para a Conservação das Aves da Amazônia”. “Este, em especial, tem um objetivo específico, que é o de criar o programa de conservação em cativeiro da harpia”, afirmou.

O Refúgio Biológico

O Refúgio Biológico Bela Vista está instalado em uma área de 1.908 hectares na margem brasileira da usina, em Foz do Iguaçu (PR). Ele reúne hoje a maior diversidade de espécies da flora e da fauna regional, muitas delas ameaçadas de extinção.

O espaço é aberto à visitação pública de terça-feira a domingo, em seis horários: 8h30, 9h30, 10h30, 13h30, 14h30 e 15h30. A duração do passeio é de aproximadamente duas horas e meia. Durante o passeio, os turistas podem ver o recinto das harpias. Os casais do programa de reprodução da espécie ficam em ambiente isolado. Para saber mais sobre visitas, acesse www.turismoitaipu.gov.br.

(Divisão de Imprensa – Itaipu Binacional – fotos: Alexandre Marchetti)

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